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D I R E I T O    &    D E F E S A    D O    C O N S U M I D O R
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Uma breve reflexão acerca do tratamento constitucional diferenciado ao portador de necessidades especiais
Por Dr. Lucas Zabulon (*)

No contexto democrático brasileiro em que nossa carta magna foi concebida, identifica-se, com facilidade, a grande preocupação com a efetivação dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos.

No entendimento clássico de Canotilho, os direitos de defesa dos cidadãos encontram-se sob uma dupla perspectiva: “(1) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa)”. [1]

Indubitavelmente, no contexto de defesa dos “direitos dos cidadãos” figura um princípio de suma importância, o princípio da igualdade. Adotado pela Constituição de 1988, este princípio preconiza que todos os cidadãos têm o direito a tratamento idêntico pela lei, considerando os critérios de diferenciação adotados pelo ordenamento. Prevê-se a igualdade de aptidão, ou mesmo uma igualdade de possibilidades virtuais, onde se encontram vedadas apenas as diferenciações arbitrárias, aquelas desproporcionais e irrazoáveis, pois “o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça”.

Alexandre de Moraes identifica no princípio da igualdade uma “eficácia transcendente”, de modo que toda norma anterior incompatível com a pretensão de igualdade buscada pela Constituição deverá ser considerada não recepcionada. [2]

O princípio da igualdade é fundamental à análise constitucional com espeque no tratamento diferenciado deferido a um grupo de cidadãos com características peculiares: os portadores de necessidades especiais.

Curioso observar que, apesar da identidade bastante evidente entre os temas, a doutrina tradicional raramente aborda com profundidade o tratamento do portador de necessidades especiais como marca da adoção do princípio da igualdade.

Na contramão da pouca importância dada pela doutrina clássica, verificamos que o texto constitucional, por reiteradas vezes, afirma sua preocupação com a necessidade de adoção de critérios diferenciadores favoráveis aos portadores de necessidades especiais. São nada menos que treze menções diretas a este grupo ao longo do texto constitucional, algumas previstas no texto original, outras várias incluídas por emendas constitucionais ao longo dos anos. 

A grande quantidade de menções expressas feitas aos portadores de necessidades especiais se justifica em razão da constatação empírica de que, apesar do conhecimento por parte das autoridades públicas e dos cidadãos em geral da necessidade de respeito aos direitos dos portadores de necessidades especiais, estes são violados ou ignorados com bastante frequência.

Com relação à distribuição de competências, restou estabelecida como competência comum da União, dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios o cuidado da saúde e assistência pública, proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. Sendo esta uma das competências administrativas comuns a todos os entes federativos, pressupõe-se a necessidade de cooperação entre estes, visando o bem-estar em âmbito nacional com relação à saúde, assistência pública, proteção e garantia dos portadores de deficiência.

No artigo 24, foi determinado que cabe à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente acerca da proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência.

Logo, cabe à União a edição de normas de caráter geral, bem como, aos Estados-Membros, a edição de normas específicas e, no caso de inércia daquele, estabelece-se a competência plena dos Estados-Membros, garantindo-se a existência do que o Ministro Celso de Mello chamou de "espaço aberto à livre atuação normativa do Estado-Membro". [3]

A análise do modo de distribuição de competências das matérias que versam acerca das pessoas portadores de deficiência permite inferir que o texto constitucional preocupou-se em conferir legitimidade de atuação a todos os entes federativos, justamente tendo em vista a necessidade de adoção de medidas em conjunto pelo Estado e de maneira mais abrangente possível, permitindo maior efetivação de políticas relacionadas ao tema.

A ação direta de inconstitucionalidade nº 903-6 relaciona-se diretamente à competência estatal em análise. Em apreciação de pedido liminar, restou afirmada a competência plena de Estado-Membro para exigir a adaptação de veículos de transporte coletivo às pessoas portadoras de deficiência na ausência de legislação por parte da União nesse sentido, defendendo-se, ainda que em sede liminar, a constitucionalidade da Lei número 10.820/92 do Estado de Minas Gerais. A seguir a tendência exposta liminarmente pela suprema corte, o mérito deve confirmar a constitucionalidade da lei mineira. [4]

A carta magna foi prolixa ao falar da defesa dos direitos dos PNE´s. Tratam-se, na verdade, de verdadeiros direitos fundamentais e que, portanto, gozam de aplicação imediata.

Ainda que determinadas normas constitucionais prevejam a necessidade de promulgação de lei infraconstitucional para regular determinados direitos, por óbvio que aceita-se a possibilidade de manejo de medidas judiciais a fim de implementar os direitos do portador de necessidades especiais previstos na constituição de maneira imediata, sejam relacionadas à acessibilidade, à educação, ao direito de locomoção, a não-discriminação no ambiente de trabalho, à reserva de vagas em concursos públicos e tratamento previdenciário privilegiado.

Não podemos perder de vista que os portadores de necessidades especiais são cidadãos iguais a todos os demais. Contudo, de modo a serem igualados ao resto da coletividade, merecem tratamento diferenciado na medida de suas desigualdades, cujos limites foram propostos pela própria Constituição.


[1] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Atlas. 2010. 25. ed. p.31.

[2] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Atlas. 2010. 35. ed. p.37.

[3]MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Atlas. 2010. 25. ed. p.313.

[4] Atualmente, após pedido de informações acerca da vigência da referida norma, o processo encontra-se concluso com o Ministro Relator.

(*) O Dr. Lucas Zabulon é Advogado militante com atuação nas áreas do direito civil, Consumidor, Constitucional e Contratos.
É pós graduado em Direito Constitucional pelo Instituto de Direito Publico - IDP. Contato: zabulonescritó[email protected]. www.zabulonadvocacia.jur.adv.br.

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