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Metamorfose
Ambulante
"Se
hoje eu sou estrela amanhã já se apagou.
Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor." (Raul Seixas)
Foram necessários dezoito séculos
para que a teoria geocêntrica, segundo a qual a Terra era o centro do Universo,
formulada por Aristóteles, desse passagem para o modelo heliocêntrico de
Nicolau Copérnico, com os planetas girando ao redor do Sol.
Com todo seu conhecimento e
reputação, o mesmo Copérnico, que defendia a órbita circular dos planetas,
teve sua tese desfeita em 1609 por Kepler, que demonstrou serem as órbitas elípticas.
A história da humanidade é
repleta de passagens como estas. São os chamados paradigmas,
que designam modelos científicos aceitos por longo período e que determinam
todo o desenvolvimento posterior das pesquisas e das idéias.
Na vida em sociedade somos
igualmente regidos por modelos, padrões, normas, regras, leis. E a inclusão
social demanda acatá-los todos. E adaptar-se.
A desobediência à Constituição
torna-nos infratores, criminosos que devem ser punidos. A inobservância às
tendências da moda torna-nos excêntricos, seres abjetos que devem ser
renegados.
Estamos produzindo pessoas
customizadas, que não pensam, não refletem, não elaboram, não opinam.
Pessoas sem identidade, ou melhor, com a mesma identidade de todas as demais.
Pessoas enquadradas, presas a um plano bidimensional. A clonagem chegou ao cérebro
antes do corpo físico.
Lidere,
Siga ou Saia da Frente
A teoria evolucionista de Charles Darwin baseava-se nos seguintes fatos: os
seres vivos reproduzem-se em progressão geométrica, mas como o número de
indivíduos de cada espécie tende a permanecer relativamente constante,
significa que há uma luta pela vida na qual sagra-se vencedor o mais adaptado
ao meio-ambiente.
Quando olho para o mundo
corporativo de hoje enxergo com nitidez a aplicação da tese darwiniana. O número
de trabalhadores multiplica-se exponencialmente, mas como a quantidade de
empregos tende a permanecer estável, ou até se reduzir, identificamos uma luta
pela inserção profissional onde conquista a vaga não o melhor, mas o mais
adaptado ao meio-empresa.
O mais adaptado pode sê-lo
porque foi indicado por alguém influente, porque estruturou bem seu currículo,
porque se comportou adequadamente na dinâmica de grupo, porque deu as respostas
precisas às velhas questões formuladas durante a entrevista, porque durante
todo o processo usou roupas com o corte certo e o perfume na quantidade necessária.
O mais adaptado pode não ser o
melhor tecnicamente, o mais preparado ou o mais competente. Foi apenas o mais
flexível, dentro de sua mediocridade e de sua hipocrisia calculadas. Importa
que ele foi o vencedor...
Se você tem personalidade
suficientemente forte, pode ingressar no “sistema” com base no modelo
descrito acima. Para tanto, terá que declinar momentaneamente de algumas de
suas idéias para, num segundo estágio, trazê-las à tona buscando influenciar
os que o cercam. Primeiro você se adapta ou denota ter-se adaptado. Depois,
propõe um novo modelo e o conduz. Assim são forjados os líderes corporativos
de hoje.
Mas este pode não ser o seu
perfil de modo que você, uma vez adaptado, assim permanecerá. Assim é a
maioria. Assim são os liderados.
Há evidentemente a classe
daqueles que não se adaptam, nem para liderar, nem para serem liderados. Estes
são os negligenciados.
Idéias
e Ideais
Há uma distinção entre idéias
e ideais. Não precisamos ficar presos aos mesmos argumentos quando outros, mais
convincentes, nos visitam. É preciso praticar a flexibilidade. Keynes dizia:
“Quando mudam os acontecimentos, mudo de idéia”. Mas não se deve mudar de
opinião se não se pode mudar também a conduta.
Já princípios são inegociáveis.
Foi a luta pelo ideal de liberdade da Escócia que fez com que William Wallace
preferisse sua execução a jurar lealdade à Inglaterra, como bem retrata o
filme “Coração Valente”, estrelado por Mel Gibson.
Como exemplo desta metamorfose
ambulante que somos, nada melhor que o próprio amor e suas idiossincrasias. A tênue
linha que separa amor e ódio, atenção e indiferença, carinho e omissão.
Garcia Marques nos ensinou que
amamos outra pessoa não por quem ela é, mas por quem nos tornamos na sua
presença. “Amar”, disse Mário Quintana, “é mudar a alma de casa”.
Muitos são os lares que a vida
nos reserva...
Tom
Coelho
Matéria da 3ª semana de fevereiro / 2004
Tom Coelho, com graduação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA/USP, é empresário, consultor, escritor e palestrante, Diretor da Infinity Consulting, Diretor do Simb/Abrinq e Membro Executivo do NJE/Fiesp. Contatos através do e-mail t[email protected]. Visite www.tomcoelho.com.br.
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