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- I N T E L I G Ê N C I A      P O L Í T I C A -
16 / janeiro / 2006

"Ele foi o primeiro e talvez o último, a sustentar que o estado deve ser governado não pelos mais ricos,   
os mais ambiciosos ou os mais astutos, mas pelos mais sábios."    

(Percy Shelley)    

ESTUDO DA POLÍTICA - Capítulo II
História: Platão e a Ciência Política
Por Fernando Toscano (*)

            Diversamente de Sócrates, que era filho do povo, Platão nasceu em Atenas, em 428 ou 427 a.C., de pais aristocráticos e abastados, de antiga e nobre prosápia. Temperamento artístico e dialético - manifestação característica e suma do gênio grego - deu, na mocidade, livre curso ao seu talento poético, que o acompanhou durante a vida toda, manifestando-se na expressão estética de seus escritos; entretanto isto prejudicou sem dúvida a precisão e a ordem do seu pensamento, tanto assim que várias partes de suas obras não têm verdadeira importância e valor filosófico.

            Aos vinte anos, Platão travou relação com Sócrates - mais velho do que ele quarenta anos - e gozou por oito anos do ensinamento e da amizade do mestre. Quando discípulo de Sócrates e ainda depois, Platão estudou também os maiores pré-socráticos. Depois da morte do mestre, Platão retirou-se com outros socráticos para junto de Euclides, em Mégara.

            Daí deu início a suas viagens, e fez um vasto giro pelo mundo para se instruir (390-388). Visitou o Egito, de que admirou a veneranda antigüidade e estabilidade política; a Itália meridional, onde teve ocasião de travar relações com os pitagóricos (tal contato será fecundo para o desenvolvimento do seu pensamento); a Sicília, onde conheceu Dionísio o Antigo, tirano de Siracusa e travou amizade profunda com Dion, cunhado daquele. Caído, porém, na desgraça do tirano pela sua fraqueza, foi vendido como escravo. Libertado graças a um amigo, voltou a Atenas.

            Em Atenas, pelo ano de 387, Platão fundava a sua célebre escola, que, dos jardins de Academo, onde surgiu, tomou o nome famoso de Academia. Adquiriu, perto de Colona, povoado da Ática, uma herdade, onde levantou um templo às Musas, que se tornou propriedade coletiva da escola e foi por ela conservada durante quase um milênio, até o tempo do imperador Justiniano (529 d.C.).

   
         Platão, ao contrário de Sócrates, interessou-se vivamente pela política e pela filosofia política. Foi assim que o filósofo, após a morte de Dionísio o Antigo, voltou duas vezes - em 366 e em 361 - à Dion, esperando poder experimentar o seu ideal político e realizar a sua política utopista. Estas duas viagens políticas a Siracusa, porém, não tiveram melhor êxito do que a precedente: a primeira viagem terminou com desterro de Dion; na segunda, Platão foi preso por Dionísio, e foi libertado por Arquitas e pelos seus amigos, estando, então, Arquistas no governo do poderoso estado de Tarento.

            Apelando para o mito da destruição e reconstrução do cosmo, Platão descreveu no seu diálogo "Político", num primeiro momento, a Era de Cronos, o tempo, e sua transição para a Era de Zeus, o seu filho (quando a Idade de Ouro dos homens esfumara-se nos pretéritos). A seguir, tratou dos humanos nascidos neste novo período pós-Paraíso, quando eles perceberam que os tempos eram outros, que desaparecera a harmonia que havia outrora entre eles e os animais, que os bichos não só perderam a fala, como tornaram-se hostis e ferozes, obrigando os homens a se organizarem em grandes grupos, fechados em regimes políticos, para poderem sobreviver à crescente selvageria dos tempos de Zeus.

Todos se consideram aptos

            Para Platão, o primeiro e fundamental problema da política é que todos os homens acreditam-se capacitados para exercê-la, o que lhe parece um grave equívoco, pois ela resulta de uma arte muito especial. Distingue então três tipos de artes:
1 - aquelas que ele chama de auxiliares (que podemos classificar como as de ordem técnica, como o artesanato, a marinhagem, o pastoreio, etc...);
2 - em seguida vem as artes produtoras (o plantio, a tecelagem, o comércio, etc..), e por último:
3 - a arte de saber conduzir os homens, que seria a política propriamente dita, superior a todas as outras.

A Política é Tecelagem

            Para melhor ilustrar o seu ponto de vista, recorre a uma comparação: a atividade do político, disse ele, assemelha-se à da tecelagem. Nada mais é do que a arte da vestimenta, o que implica na escolha do tecido, das peças que devem ser costuradas à mão, e da armação final, pois seu objetivo maior é dar segurança e abrigo, da mesma forma que um trajo protege das intempéries e assegura os pudores. Por isso, o político deve desenvolver habilidades tais como saber cardar e fiar, porque um dos seus afazeres maiores é conseguir misturar o tecido maior e melhor com o menor e o pior (isto é, encontrar o equilíbrio entre os fortes e poderosos e os mais fracos e indefesos).

            Quem, porém, entre eles, pode se habilitar a esta arte, a de dedicar-se à ciência do tecer? O pensador então estabelece uma espécie de escala da qual, a princípio, são eliminados os escravos, fazendo a seguir restrições também a maioria dos homens livres em geral (aos camponeses, aos artesãos, aos comerciantes e aos marinheiros, desqualificando-os para o exercício de tal arte). Entre os que realmente ambicionam dominar a arte da política, ele aponta os pertencentes aos setores intelectualizados da sociedade: os arautos (os mensageiros), os advinhos, os sacerdotes e os magistrados. Ocupando um lugar especial entre esses que querem ter voz ativa na política, ele identifica um estranho grupo que diz ser composto por centauros, sátiros e outros animais fantásticos, que rondam por assim dizer o mundo da política, ameaçando toda hora quer dele participar ativamente (o que nos leva a interpretar tal grupo bizarro como uma metáfora dos elementos irracionais que pululam na sociedade tentando dominá-la).

Poucos são os que sobram

            Em nenhum deles Platão vê qualidades que os habilitem à arte da tecelagem, à capacidade de urdirem os delicados fios que enlaçam e fortalecem a vestimenta protetora. De certo modo, a lendária atitude de Penélope, a mulher de Ulisses que ficava noite e dia fiando e desfiando, esperando a volta do marido - o Rei Competente - ganhando tempo para que ele pudesse voltar e reassumir o trono, afastando com isso os pretendentes à coroa de Ítaca, era uma versão mítica do que o filósofo pretendeu dizer.

As formas da política

            A seguir, dedica-se a descrever as formas em que os regimes político se constituem, adotando a conhecida classificação numeral: o regime de um homem só (que se subdivide em monarquia, onde um rei obedece a lei e a tradição), e na tirania, (o governo discricionário); o regime de alguns (o governo de um grupo que se subdivide em oligarquia e aristocracia); e, por fim, o governo dos muitos (a democracia). Neles opõem-se nos mais diversos graus, a riqueza e a pobreza, a violência e a liberdade, a obediência às leis escritas ou a ausência de leis. Qual dentre eles afigura-se como o melhor?

            Platão minimiza a importância das formas que os regimes políticos assumem. Neste momento da sua exposição, por meio do Estrangeiro, personagem principal do diálogo, a monarquia, a tirania, a oligarquia, a aristocracia ou a democracia, afiguram-lhe ser de menor interesse perante o fato maior de saber-se dominar a ciência da política. Pois é esta ciência (a que determina o que realmente é importante para a política), a arte de saber governar os homens, "a mais difícil e maior de todas as ciências possíveis de se adquirir", é que nos possibilita a ajudar a afastar os rivais do Rei Competente (isto é, o governante ideal). Ela é um instrumento de seleção que, ao mesmo tempo que nos permite dissuadir os pretendentes equivocados, auxilia a persuadir os vocacionados a ingressarem na política.

O Rei Competente como Médico

            Para o pensador é o Rei Competente quem merece ser o arcon, de ter o titulo de rei, pois somente ele detêm o conhecimento da ciência política, estando no poder ou não. Assim, independentemente da forma do regime político, seja monarquia, oligarquia ou democracia, só os que possuem a ciência de saber governar os homens é que devem realmente exercer o poder. Platão ainda não menciona aqui (o fará com maiores detalhes no diálogo "A República") que seu intuito é promover o filósofo, o homem sábio, como o único habilitado a tal. O Rei Competente assemelha-se para ele ao médico que, curando ou não seus pacientes, detém a arte da medicina, serão sempre chamados de médicos.

Ele pode tudo

            A partir do momento que o Rei Competente galga o poder, torna-se indiferente, sob o ponto de vista moral, o sentido que dará a sua ação. Pode ele exilar, mandar executar, deslocar gente a sua revelia, fazer o que lhe convier, que tudo estará justificado pela ciência que ele tem das coisas do governo, porque seu fim último é a justiça. Até mesmo poderá governar sem leis ou a revelia delas, pois muitas vezes o bom governante pode dispensar, em nome do bem público, que é superior a tudo, a lei escrita e o costume. É desta passagem de Platão, que Maquiavel, bem mais tarde, no Renascimento, extraiu os argumentos que sustentaram a sua teoria do domínio absoluto do Príncipe. Também parte dela a atitude da maioria dos iluministas do século XVIII que justificaram o seu apoio ao Déspota Esclarecido.

A Massa e a Elite

            Platão, como é sabido, não era um simpatizante da democracia. Logo, ele não via nenhuma possibilidade das massas conseguirem algum dia apropriarem-se da ciência da política. Elas, por sua própria natureza, são incapazes de administrar com inteligência uma cidade. Somente um pequeno grupo ou um só indivíduo terá o domínio desta constituição verdadeira. Poderia, pergunta ele justificando-se, uma multidão reunida em assembléia, regular para sempre a arte da navegação ou estabelecer o tratamento a ser dado aos enfermos? Tais regulamentos caberiam ser fixados por gente do povo ou mesmo pelos ricos? Na verdade quem se atrevesse a tal, a ser um intrometido nas regras da navegação ou da medicina, seria chamado de visionário ou de fraseador sofista. Se estas artes fossem conduzidas pela sorte (Platão aqui critica abertamente o sistema eleitoral por sorteio adotado pela democracia grega), pela letra escrita aprovada em assembléia e não pela arte da política, a vida, assegurou ele, se tornaria insuportável.

O Verdadeiro Político

            Quem realmente domina a ciência da política, não se inspira nas leis escritas mas sim na arte com que é dotado, nesta rara habilidade de saber conduzir os homens. Portanto, o único bom governo possível é o do "único competente". No entanto, por que isto não ocorre? Para Platão todos os regimes conhecidos (monarquia oligarquia, democracia, e suas variáveis) nada mais são do que a expressão juridicamente organizada da rejeição aberta ou velada que os homens têm ao único eficaz. Formada por gente cabeça dura, a sociedade nega-se a aceitar que haja alguém, tal como o Rei Competente, que possa, com autoridade, governar com virtude e ciência, com imparcialidade, com justiça e eqüidade, sem precisar injuriar ninguém. Portanto, todo o regime político conhecido não passa de uma ilusão pois ele sempre resulta dessa aversão à boa razão. De uma máscara que tenta ocultar o seu fracasso. Ao repelirem a evidência de que o único bom governo viria do Rei Competente, todas as constituições são imperfeitas, restando apenas a escolha da que for menos desagradável. Quanto aos politicos que resultam delas, dos regimes assinalados, devem ser repelidos por serem uns falsos, criadores das piores ilusões.

Artes Próximas mas Subordinadas à Política

Estratégia Arte de fazer a guerra Subordina-se à decisão superior de fazer-se ou não a guerra
Jurídica Arte de aplicar a justiça Subordina-se a existência das leis que são aprovadas em outras instâncias, determinada pelo arcon ( o governante) ou pela assembléia.
Retórica Arte da Oratória Presa às circunstâncias, estimulada e condicionada pela situação momento, portanto totalmente subordinada.

A Política é a Ciência Soberana

            Se nem a estratégia, nem a justiça, muito menos a retórica, são artes independentes, só resta a política como a verdadeira e única arte superior. É ela a ciência real. Ainda que não possuindo obrigações práticas, reina sobre os demais, unindo a sociedade num só tecido perfeito. O que ela consegue é graças a harmonia das leis que elabora. O objetivo de toda a ciência política é eliminar ao máximo os maus elementos, conservando porém os bons e úteis para então "fundi-los numa obra perfeitamente una por suas propriedades e estruturas".

Bibliografia


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