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C O M P O R T A M E N T O -
16
/ outubro / 2005
“Dominar o medo é o início da
sabedoria”.
(Bertrand
Russell)
VÔO
3840
Por Tom Coelho, colunista-titular do Portal Brasil (*)
As nossas primeiras experiências são todas muito peculiares. Algumas frustrantes, outras insípidas, a maioria inesquecíveis.
O episódio
se passa no aeroporto de Confins, em Belo Horizonte. Estou a caminho de
Palmas, capital do Tocantins, com escala em Brasília. O embarque é anunciado
nos alto-falantes. Como de hábito, sou um dos últimos a seguir para a ponte
que dá acesso à aeronave – procuro distanciamento de filas de qualquer
qualidade porque elas me fazem sentir desrespeito no uso do tempo.
Eis que surge
no horizonte, um pouco apressados, um casal – mãe e filho. O garoto,
contando não mais do que dez anos de idade, apresenta à despachante seu cartão
de embarque. Seu e de sua mãe. Pele morena, cabelos muito pretos e muito
curtos, seu semblante denota um ar de seriedade, talvez até falta de alegria.
Quando nos
aproximamos da porta do avião ouço o jovem dizer à sua atenta companhia:
- Mãe, tô com medo...
Neste
instante, compreendo o porquê de cada marca de expressão que contorna sua
face. Trata-se de seu primeiro vôo, uma experiência única, quase um rito de
passagem.
As nossas
primeiras experiências são todas muito peculiares. Algumas frustrantes,
outras insípidas, a maioria inesquecíveis. O primeiro dente que cai, a
primeira briga, o primeiro beijo. A primeira aprovação num concurso
vestibular, com direito a cara pintada e cabelo podado. O primeiro trabalho
remunerado e o primeiro dinheiro ganho a partir do próprio esforço.
Rubem Alves
disse em uma de suas crônicas: “O prazer é único, não se repete. A
alegria repete-se sempre. Basta lembrar”. E, de fato, o sorriso ganha
meus lábios quando me remeto à memória de momentos especiais que pude
viver.
É curioso
como desejamos muitas coisas e lutamos para conquistá-las, negligenciando-as
logo em seguida. Faço uma analogia com as crianças que passam um ano inteiro
insistindo em determinado brinquedo como presente de aniversário
abandonando-o depois de uma hora de diversão. Temos dificuldade de apreciar
nossas conquistas...
Também tive,
é claro, meu primeiro vôo. Recordo-me do quão impressionado fiquei com a
arquitetura do aeroporto, com a engenharia da aeronave, com a eficiência do
atendimento, com o cenário vislumbrado através da pequena janela. Hoje,
pululando de um avião para outro, o que era admirável virou lugar comum. Uma
companhia aérea não me vende transporte, segurança ou serviço de bordo. O
que eu compro dela é economia de tempo.
A sorte
negou-me o privilégio de sentar-me próximo ao jovem viajante para acompanhar
sua ansiedade na decolagem ou sua angústia durante o pouso. A última imagem
que registrei foi de sua mãe, máquina fotográfica em punho, fotografando-o
na porta da cabine de comando. E seu sorriso contagiante como que declarando
ao mundo a transposição de mais um estágio de seu crescimento: agora, ele
também pode voar.
Queria eu que
todos os sorrisos fossem expressivos como aquele. E que todos os nossos medos
pudessem ser como o que ele sentiu ao se aproximar do avião: medo que
desafia, mas não paralisa; medo que se enfrenta e se supera.
Tom
Coelho
Matéria da 2ª quinzena de outubro / 2005
(*) Tom Coelho, com graduação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA/USP, é empresário, consultor, escritor e palestrante, Diretor da Infinity Consulting, Diretor do Simb/Abrinq e Membro Executivo do NJE/Fiesp. Contatos através do e-mail [email protected]. Visite www.tomcoelho.com.br.
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