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01
/ maio / 2005
“Aos
20 reinará a vontade;
aos
aos 40, o bom senso.”
(Benjamin Franklin)
DIÁRIOS
DE GUERRA
Por Tom Coelho, colunista-titular do Portal Brasil (*)
A vida tem me
tratado bem. Não que tenha sido ou que esteja sendo fácil. Mas fazendo
apologia à teoria da relatividade, tudo é uma questão de referencial.
Tive uma saúde debilitada já na mais tenra idade. Lembro-me com exatidão das
longas jornadas empreendidas por minha mãe, eu de mãos dadas a ela, saltando
de um ônibus para outro, em direção a um hospital público para tratamento de
uma febre reumática. A posologia prescrevia penicilina benzatina, além de
corticóides para amenizar as incômodas dores incidentes nas articulações. As
injeções eram doloridíssimas. E aplicadas com uma freqüência incomum –
dias alternados no início do tratamento até a periodicidade mensal.
Como se não bastasse, também fui premiado com as mais diversas manifestações
alérgicas. É mais fácil eu sucumbir a partir de um comprimido contendo
dipirona do que diante de uma guilhotina!
Do reumatismo herdei um sopro cardíaco, seqüela comum à enfermidade. Da
alergia, uma pretensa fragilidade nas vias respiratórias. Porém, não houve
espaço para tais manifestações. Entreguei-me ao esporte, praticando as mais
diversas atividades, de basquetebol a artes marciais, passando por natação,
canoagem, iatismo e até pára-quedismo. Hoje, dedico-me à esgrima e ao surfe.
O primeiro para competir e satisfazer uma necessidade tenaz de colocar-me à
prova. O segundo para simplesmente não ter que competir contra ninguém – nem
eu mesmo. Que o mar faça sua vontade.
Minha família constituiu-se grande e restrita ao mesmo tempo. Grande, porque
formada por mais quatro irmãs. Restrita, porque não se estendia aos primos,
tios e mesmo avós. Admiro quem teve ou tem a presença onisciente das
“nonas” e a casa sempre cheia aos domingos. Todavia, os fatos de meu pai não
estar em casa para assistir ao telejornal anterior à novela e não
compartilharmos juntos das refeições à mesa, não foram suficientes para nos
tornar menos unidos ou para arrefecer o amor que ainda hoje nos envolve, mesmo
após a partida de minha mãe.
De filho a pai, de amigo a amante, de namorado a esposo – e, depois, ex-marido
– os relacionamentos pessoais foram cada qual lapidando minha personalidade,
cunhando meu caráter, marcando minha alma. Do êxtase do beijo à amargura da
separação, todos foram significativos. Um sentimento destilou-me o prazer. O
outro, o aprendizado. O amadurecimento ensina que não vale a pena ofender,
embora você o faça; doutrina que assim como o corpo se acostuma à dor, o coração
assimila o rompimento quando percebe que a pior solidão é aquela que se sente
acompanhado.
Entre conhecidos e colegas, veio o legado de alguns bons amigos. Muitos
perderam-se no tempo, mas não se esvaíram da memória. Os amigos e as
brincadeiras, estas praticadas à luz do luar, tarde da noite, pijamas à
mostra, sem trânsito para ferir ou insegurança para amedrontar. Os jogos não
eram eletrônicos, por isso custavam pouco. Bastavam palmas, pernas e sorrisos.
Hoje os amigos são outros e curiosamente os melhores surgiram eletronicamente,
não sintetizados, é claro, mas apresentados pelo clique de um botão. Gente de
tudo quanto é lugar, uns próximos, outros distantes, mas sempre presentes como
se estivessem diante de mim na sala de estar. Confortam e pedem consolo. Ajudam
e clamam por auxílio. Para ficar completo, falta apenas o abraço. Ah... se
houvesse o teletransporte!
Profissionalmente, levei quinze anos para me descobrir. Por vezes, mais difícil
do que a descoberta é a aceitação. Enfrentar o receio de trocar o pouco certo
ao muito duvidoso. Você faz o que tem medo e ganha coragem depois, não antes.
Mas isso também não se ensina na escola acadêmica, apenas se aprende na
escola da vida.
Quando você depura tudo o que lhe cerca percebe que a simplicidade começa a
reinar. E ser simples não significa ser pequeno, mas dispor do que é crítico
e imprescindível. Luz e calor do sol, companhia e aconchego brilhante da lua.
Cores, sabores e texturas dos alimentos. Ritmo, melodia e harmonia dos sons.
Filme com pipoca e refrigerante a dois. Fé e gratidão.
Mas nunca estamos satisfeitos. Pessoalmente eu deveria nutrir uma sensação de
quietude. Uma onda no mar, uma nota no saxofone, uma tarde com os filhos, uma
cerveja gelada com os amigos, um beijo apaixonado, uma refeição saborosa, uma
noite revigorante, um bom livro, uma mão que assiste a quem precisa, uma dívida
do passado resgatada, um artigo escrito com amor e lido com prazer.
Contudo, há um mundo enigmático lá fora. Um mundo de diferenças habitado por
pessoas indiferentes. Um mundo que cultua o conflito, que se afasta do consenso.
Um mundo que desejo mais que conhecer, registrar.
Por isso pretendo escrever “Diários de
Guerra”. Percorrer nações na iminência, durante e após um conflito bélico.
Compreender o porquê de sua ocorrência e quais seus efeitos sobre a sociedade,
a cultura e a economia de um país. Estudar a correlação com as várias religiões,
crenças e dogmas. E, fundamentalmente, observar e analisar os reflexos sobre as
pessoas.
Este é um projeto para daqui alguns anos cuja duração e início estão
diretamente relacionados à oportunidade de compartilhá-lo com um veículo da mídia
eletrônica ou impressa. Com apoio, tornar-se-á rapidamente viabilizado. Sem
apoio, apenas demandará mais tempo.
Talvez eu esteja buscando conhecer melhor a humanidade. Talvez esteja em busca
de conhecer a mim mesmo. Talvez esta busca contínua seja apenas uma forma de
reverenciar minha própria liberdade. Sei apenas que prefiro a angústia da
busca à paz da acomodação.
Tom
Coelho
Matéria da 1ª quinzena de maio / 2005
Tom Coelho, com graduação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA/USP, é empresário, consultor, escritor e palestrante, Diretor da Infinity Consulting, Diretor do Simb/Abrinq e Membro Executivo do NJE/Fiesp. Contatos através do e-mail [email protected]. Visite www.tomcoelho.com.br.
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