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D I R E I T O    &    D E F E S A    D O    C O N S U M I D O R
0 1  /  A  B  R  I  L  /  2 0 0 8

DIREITO PARA TERRÁQUEOS E MARCIANOS
Por Gladston Mamede (*)

                       “O aparecimento do primeiro satélite artificial russo com a aproximação dum Novíssimo Mundo, com o descobrimento do mundo interplanetário, mostra a necessidade da criação dum Novíssimo Direito, dum direito Interplanetário”. Assim, o prof. Haroldo Valadão, da Faculdade Nacional de Direito (Rio de Janeiro), começou seu artigo “Direito interplanetário e Direito intergentes planetárias”, publicado na Revista Forense n. 177, de 1958. No rodapé, ele diz que seu texto foi desenvolvido logo após a notícia do feito aeroespacial dos soviéticos: o lançamento do Sputnik.

            O texto, muito bem escrito, poderia ser colocado num museu ou livro sobre o futuro que não foi. É fascinante retrospectar-nos (ich!) nesses quase 50 anos, para contrastar o que se acreditou que seria com o que efetivamente foi. A notícia da engenhoca soviética provocou um frenesi, abrindo possibilidades exuberantes para a imaginação. Escreve Valadão: “As grandes invenções, dando ao homem um excessivo poder material, mas expondo seus semelhantes, também, aos maiores perigos, exigem logo uma nova disciplina jurídica.” Daí a necessidade do “nascente Direito interplanetário, regulador jurídico do espaço interplanetário, desse meio acima do espaço aéreo onde circulam satélites artificiais e se desenvolverá a navegação entre os planetas.” Delírio? O Direito Aerospacial não é uma promessa, mas realidade, enfrentando atualmente os desafios do acúmulo de lixo espacial em torno a terra.

            Haroldo Valadão, no entanto, vai além: “A seguir, com os progressos da utilização do espaço interplanetário, com as anunciadas comunicações da Terra com outros planetas, e a possibilidade destes serem habitados, surgirá então o ‘jus inter gentes planetarum’, o Direito intergentes planetárias. Esse futuro direito irá disciplinar as futuras relações entre os habitantes da Terra e os respectivos grupos humanos com os seres e povos encontrados noutros planetas, com os possíveis senelenitas, marcianos etc. [...] Ficará, porém, o Direito intergentes planetárias acima do Direito internacional, assim como este se situa acima do Direito interno nos seus três graus: Direito constitucional, Direito legal e Direito regulamentar.”

            Sonham também os juristas! Cultivam valores e tradições antigas, mas estão atentos ao seu mundo e ao mundo futuro. Valadão, elegantemente, faz a ponte entre os romanos e os marcianos, dando ao seu novíssimo ramo jurídico um pomposo rótulo latino: “jus inter gentes planetarum”, bem como se referindo ao espaço sideral como “res communis omnium”, ou seja, coisa comum a todos (terráqueos, marcianos etc). Isso para não falar no termo “senelitas”, evocando Selene, figura mitológica grega que se identifica com a lua; senelitas, portanto, são – ou seriam – os habitantes lunares. Deus! Um espetáculo. Imagino esse professor de Direito, fascinado com a notícia do Sputnik, correndo para a sua máquina de datilografia. Naquele tempo, o Brasil ainda não era conhecido como país do carnaval e do futebol (não se ganhara, ainda, a primeira copa), nem da bossa nova.

            Tom Jobim tinha 23 anos e um professor de Direito se permitiu contemplar um futuro que julgava possível. Consciente de seu papel, prepara os novos tempos: “Mas os homens e seus grupos de poder, os Estados, na sede de domínio, sobre seus semelhantes, sede gerada pelo orgulho, pretenderam, muitas vezes, levar o seu direito de propriedade ou de soberania até as próprias coisas comuns. [...] Em verdade, a ‘res omnium’ posta pela natureza à disposição de todos (‘omnibus patent’), pode ser livremente usada pelos homens, individualmente considerados, seja terrestres, selenitas, marcianos etc... ou pelos grupos de homens, nações, Estados, ‘gentes’ da Terra ou dos planetas. [...] Inadmissível, pois, a anexação da Lua, de Marte ou de qualquer outro satélite ou planeta, pelo Estado da Terra que primeiro o atingir.”

            Passados 50 anos, contudo, o mundo continua entre criminosos (agora organizados) e guerras. Frustrou-se, infelizmente, a expectativa de Valadão: “Serão construídos, pois, sob bases jurídicas universais do Amor, da Justiça e da Eqüidade, que respeitem a personalidade do ser humano onde quer que se encontre, no espaço aéreo ou atmosférico, no espaço solar ou interplanetário e mesmo além.” Arremata: “E assim a magnificente exclamação de São Paulo: ‘Não há, pois, judeu nem grego, escravo ou livre, varão ou fêmea, pois sois, todos um em Jesus Cristo’ valerá também nos espaços interplanetários.”

            O que posso dizer, senão Amém?

(*) Gladston Mamede, colunista-titular do Portal Brasil, é bacharel e doutor em Direito pela UFMG, Diretor do Instituto Jurídico Pandectas, autor da coleção
"Direito Empresarial Brasileiro" e do "Manual de Direito Empresarial" (Editora Atlas) - E-mail:
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