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D I R E I T O    &    D E F E S A    D O    C O N S U M I D O R
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A garantia constitucional do sigilo bancário e fiscal
Por Dr. Lucas Zabulon (*)

Um dos aspectos relevantes de proteção constitucional à vida privada dos indivíduos diz respeito à garantia de sigilo bancário e fiscal.

A magna carta, em seu inciso XII do artigo 5, prevê de forma ampla a inviolabilidade da vida privada, e em análise mais restrita, encontra-se neste dispositivo o direito à privacidade e ao sigilo bancário e fiscal. 

Esta garantia assegura ao indivíduo “discrição a respeito de negócios, presentes ou passados, de pessoas com quem lidaram, abrangendo dados sobre a abertura e o fechamento de contas e a sua movimentação" [1]. Este conceito doutrinário reproduz o conteúdo material desta garantia constitucional, assegurando ao indivíduo a garantia de que nenhum de seus negócios particulares serão, em regra, de conhecimento de terceiros.

Evidentemente, ao passo que falamos de garantias constitucionais, o direito ao sigilo bancário e fiscal não pode ser considerado absoluto ou ilimitado. Permitir que assim o fosse seria extremamente perigoso ao Estado de Direito, visto que este direito poderia ser utilizado inescrupulosamente para acobertar outras violações a direitos alheios. Quando na eventualidade de ocorrência de ilícitos ou em qualquer fase de investigação criminal, poderá ser decretada legalmente a quebra de sigilo.

A razão para tanto é que estamos diante da proteção de direitos igualmente valorados. Portanto, sempre que houver necessidade de preservação de um direito ou valor que também possua importância constitucional, e que, a partir de uma ponderação realizada em cada caso concreto, tenha-se concluído pela sua sobreposição à garantia de sigilo, esta poderá ocorrer, sem que ocorra violação ao direito de sigilo de dados bancários.

Como exemplo, podemos considerar o caso de suspeita de cometimento de fraude por parte de um dos sócios de uma sociedade empresária. Nada impede que o sócio supostamente lesado requeira tutela jurisdicional no sentido de verificar se a movimentação bancária de seu sócio condiz com as suspeitas de recebimento de haveres da empresa em manobra fraudulenta.

Contudo, o pedido, ainda que possível, deverá ser sempre específico e acompanhado da prova de sua utilidade e necessidade, o que implica em dizer que a quebra de sigilo era o único meio possível para se obter determinada informação.

Além do Poder judiciário, insta ressaltar que é entendimento jurisprudencial e doutrinário pacífico que as Comissões Parlamentares de Inquérito poderão determinar diretamente a quebra de sigilo bancário de seus investigados, bastando que a determinação seja suficientemente fundamentada.

Entretanto, apesar da expressa proteção constitucional, não é incomum haver quebras de sigilos bancários e fiscais de indivíduos ao arrepio da lei. A jurisprudência coleciona vários exemplos de instituições bancárias que cedem informações resguardadas com sigilo a terceiros ou até mesmo a outras instituições bancárias.

Há casos em que uma instituição bancária entra em contato com clientes de outros bancos com ofertas de serviços aparentemente mais vantajosos do que os que o cliente atualmente possui. Contudo, há de se redarguir: como referido banco sabe quanto o cliente paga de taxas bancárias ou mesmo quanto movimenta por mês? O conhecimento de informações tão particulares é indício de que houve uma violação ao direito constitucional de privacidade no tocante aos dados bancários e fiscais.

Não podemos perder de vista que o cliente dos bancos é, também, consumidor. E havendo qualquer situação em que se verifique violação ao seu sigilo bancário, incidirá o Código de Defesa do Consumidor e todas as suas garantias. Neste sentido, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1094770/DF. [2].

A própria Constituição, por sua vez, define que nestes casos de violação à intimidade na perspectiva do sigilo bancário e fiscal, está “assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios analisou caso concreto em que um particular tentou obter dados bancários de um cliente de banco particular e diante da tentativa frustrada pela negativa do banco ingressou em juízo postulando danos morais. Entretanto, o TJDFT julgou o pleito improcedente tendo em vista que o banco agiu corretamente ao negar informações bancárias de clientes a terceiros em virtude da regra constitucional do sigilo bancário. [3].

Em outro caso, compartilhando a mesma linha de raciocínio exposta, o TJDFT entendeu por violado o sigilo de cliente por parte da instituição bancária fornecedora de serviços que, sem prévia autorização do mesmo ou sem ordem judicial, disponibilizou a terceira pessoa contratos de mútuo firmados entre o cliente e o banco. O entendimento consolidou-se no sentido de que o contrato de mútuo insere-se na categoria “operações bancárias” e que revelá-las, ainda que sem intenção específica de prejuízo, configura quebra indevida do sigilo e se sujeita a reparação civil. [4].

A Lei Complementar n 105 define concretamente que o sigilo engloba “operações ativas ou passivas e serviços prestados” pelas instituições financeiras. Estes termos, propositalmente amplos, visam proteger da melhor maneira os direitos dos indivíduos nas relações bancárias.

Por tudo, o sigilo bancário e fiscal encontra-se consagrado na Constituição, e em caso de quebra ilícita de dados bancários, é entendimento jurisprudencial consolidado o cabimento de indenização em virtude dos danos materiais e morais causados. As exceções à regra geral da inviolabilidade apenas confirmam a importância desta garantia, e nunca se pode perder de vista que qualquer garantia individual deve se conformar com os demais direitos reconhecidos pela Constituição Federal.


[1] MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva, 5 edição.

[2] "Os serviços e produtos oferecidos pelas instituições financeiras são considerados do gênero consumo”. REsp 1094770/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2009, DJe 18/09/2009.

[3] Acórdão n. 610903, 20110910247849ACJ, Relator DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, julgado em 14/08/2012, DJ 17/08/2012 p. 197.

[4] Acórdão n. 517599, 20100111650137ACJ, Relator LUIS EDUARDO YATSUDA ARIMA, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, julgado em 21/06/2011, DJ 11/07/2011 p. 182.

(*) O Dr. Lucas Zabulon é Advogado militante com atuação nas áreas do direito civil, Consumidor, Constitucional e Contratos.
É pós graduado em Direito Constitucional pelo Instituto de Direito Publico - IDP. Contato: zabulonescritó[email protected]. www.zabulonadvocacia.jur.adv.br.

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